quinta-feira, 22 de setembro de 2011

O POETA E AS AMIGAS


O poeta arde
mas as amigas não vêm
arde dentro de si mesmo
alimenta-se
dos seus abismos
nasce de novo
mas as amigas não vêm
está triste
queria brincar com elas
dizer-lhes
o que lhe tendo vindo
à mente
nos últimos dias
em que lhe apetece
gritar na rua
soltar gargalhadas sarcásticas
insultar o homem comum
mas as amigas não vêm
por isso o poeta está ferido
a raiva cresce
olha o mundo com desprezo
com o grande desprezo
com o pior dos desprezos
não suporta a televisão
escreve
como quem espeta facas
olha o relógio
as amigas não vêm
o poeta arde
pede mais cerveja
se tivesse dinheiro
beberia até cair
até rebentar com o mundo
revolucionário alucinado
parte montras
incendeia bancos
agora resta-lhe o Do Vale
e a cerveja
ouve falar russo
se estivesse em baixo
não aguentaria
assim arde
ouve o Do Vale
está quase a rebentar
as amigas não vêm
põe-no doido
fora de si
o poeta arde
está farto do tédio
da monotonia
as horas passam
antes estar aqui
do que na aldeia
o poeta arde
abandona a razão
segue a estrada da luz
está farto
não pode mais
as amigas não vêm
não suporta mais
a imbecilidade
"mostra-me o extermínio
dos relógios e dos televisores"
escreveu
quando ainda
era um rapaz inocente
agora escreve
para suportar
a falta das amigas
deixou de ter horários
brinda ao caos
a época é-lhe propícia-
dizem no facebook
é uma espécie de profeta
vai voltar a cantar
escreve ao ritmo da vida
da verdadeira vida
é essa que quer apanhar
mas faltam-lhe as amigas
aparecem outras
não é capaz de falar-lhes
só no Pinguim
e nos outros palcos
é louco
cada vez mais louco
as palavras saem
das tripas
nunca mais será
um poeta menor.


Piolho, 22.9.2011

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