quinta-feira, 1 de outubro de 2009

ENTREVISTA A JOSÉ AZEVEDO NÓBREGA

A BUSCA INTERIOR E A CRISE DO AMOR

António Pedro Ribeiro/ Rui Sousa (foto)

"Viagem em Quarto Duplo" é o novo livro de poesia de José Azevedo Nóbrega, pseudónimo de Francisco Gonçalves. O "Quarto Duplo" é tanto "o quarto onde se vive, dorme, pensa, sonha e ama" como o quarto livro, que sucede a "Agueirinho" (Silêncio da Gaveta), "A Boca na Mão" e "A-Mei-o-Tempo" (Edições Apalavrados). José Azevedo Nóbrega é natural de Vila Real mas há 12 anos que vive na Póvoa. Para o autor, que lembra José Gomes Ferreira, a poesia "é o sussuro do insecto que também pode ser insurrecto". Daí que a natureza e a relação do homem com a natureza sejam uma temática recorrente dos seus livros. "É da dicotomia entre o sentir e o pensar que surge o poema", diz.
O poeta é também crítico do consumismo e das grandes superfícies. Daí revelar "muito mais interesse/ pelos traçados da alma/ que pelas vias rápidas/ do consumo vigente". "A situação social instaurada pelo novo economicismo leva muita gente à procura desses lugares (centros comerciais) em primeira instância muito antes de percorrer os seus próprios caminhos interiores", justifica. O que faz falta é a reflexão, a busca interior, o fogo interior. "É impossível viver sem fogo", diz.
O poema "Esperança Opaca" estabelece uma curiosa ligação entre certo tipo de mulher e a crise das bolsas. "Existem imensas mulheres que vivem à base da bolsa para consubstanciar a sua crise interior. Elas estão mais do lado materialista do que lado do amor. Em geral, a mulher é muito mais pragmática e materialista do que o homem". Daí a crise do amor: "o amor está em saldo. Compra-se em qualquer esquina. A veemência do amor profundo já poucos a vivem", justifica. José Azevedo Nóbrega evocou ainda o poeta e "diseur" Joaquim Castro Caldas, desaparecido há cerca de um ano e seu amigo e companheiro das noites de poesia do "Pinguim": "O Joaquim era uma anti-estrela porque sempre quis, apesar da notoriedade, estar do lado do desaparecimento. Era interventivo, não dava tréguas aos impostores, aos falsos e isso custou-lhe caro como aos verdadeiros poetas. Foi ostracizado, injustiçado pelos "media", mas como ele próprio diz nos seus poemas, talvez daqui a 20 anos os descendentes dos responsáveis por isso possam vir a apanhar com ele".

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