terça-feira, 6 de fevereiro de 2007

O TEMPO QUE VOLTA

O TEMPO QUE VEM A TEMPO
António Pedro Ribeiro

O livro "A-Mei-O-Tempo" (Edições Apalavrados) de José Azevedo Nóbrega, pseudónimo de Francisco Gonçalves, constitui uma reflexão/divagação poético-filosófica acerca do tempo e dos vários tempos que nos atravessam. Azevedo Nóbrega nasceu em Vila Marim (Vila Real) há 49 anos mas há nove que está radicado na Póvoa de Varzim. Publicou ainda os livros "Agueirinho" (Edições Silêncio da Gaveta, 2000) e "A Boca na Mão" (2003), e tem prevista para breve a edição de "Viagem em Quarto Duplo"."A-Mei-O-Tempo" é também amar o tempo da serenidade, da liberdade, da infância, da natureza. É daí que vem o verso "a menina dos olhos já mulher/ olhava serena transparente" (p.78), bem como as expressões da infância e da descoberta: ACAMPAR, mochila, meninice, "riso de criança", "bandeira da liberdade", ave, borboleta. Ou ainda os "verões imensos infindáveis/meses suspensos/ dias que madrugavam e esticavam bem alto (...)/ dias de luz para que os que nascem grandes para tudo até brincar" (p.12), que surgem também associados à memória dos filmes de animação: "Fantasia/Tom e Jerry/ isenção de deveres escolares."A-MEI-O-TEMPO" é ainda o tempo que rima com o verso: "Do que não se diz/ do tempo que é tempo/ da perda do tempo/ do tempo que voa/ e que tem matriz/ do tempo que vai/ do tempo que vem/ da memória do tempo/ e da sua mãe/ o tempo que é tempo/ também tem raiz/ acabou o tempo/ só o verso", onde os trocadilhos, sempre a propósito, vão de encontro ao ritmo musical que também vai e vem e desemboca na voz de Edith Piaf:" Dite edite/ esse nome de mulher mágica/ que enchia a noite/ Edite/ sem gaffe/ Edith Piaf" (p.43).Apesar do tom geral apelar à harmonia musical apolínea, expressa na torre, nas badaladas, no sino, na acalmia irrompe, por vezes, o tempo da fúria, do temporal, da revolta global: "Fura cão devasta a dor/arranca telhados/ estica a fúria/ arrasadora sem contemplação/ (...) Molha imunda/ potenciado de raiva e insatisfeito/ expolosivisidade destruidora" (129), "Catapulta da evolução/ global/ que evolói/não só mói/ mata corrói" (p.102).Amar o tempo é também amar a terra ("o esteio do tempo") e celebrar Baco/Dionisos: vinho, vinhas, videira, pipas, uva, dança, o tempo sem tempo. "A-Mei-o-Tempo" são belas paisagens a meio do tempo: "co-incenerar a manta de retalhos tecida nos abismos de cada um, para que a ternura procure a carícia no enleio dos corpos, e o espaço entre tudo e nada, mediado por tempo indefinido possa tropeçar num vocábulo, incendiar um verso, incompleto, fecundo" (106).

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